terça-feira, 27 de outubro de 2015

Sobre a Dinamarca e os progressistas

A Dinamarca é, em muitos sentidos, um país invejável: sua renda per capita, ajustada pela paridade do poder de compra, é uma das maiores da Europa, o país está em pleno emprego, a percepção da população quanto à corrupção é a mais baixa do planeta e seus cidadãos figuram em quase todos os rankings entre os mais felizes do mundo.

Não é à toa que a Dinamarca também se tornou o modelo que todos os partidos políticos mais progressistas dizem querer copiar.  

E qual o grande problema nisso tudo?  É simples: se alguns sedizentes socialistas estão conclamando uma emulação do modelo dinamarquês, então certamente eles desconhecem algumas de suas características, as quais não desagradariam em nada ao mais conservador dos partidos políticos.

A maioria dos progressistas que elogia o sistema dinamarquês opta por se concentrar exclusivamente nas partes deste sistema que lhes parecem atrativas (quanto o estado fornece de serviços) e ignoram os custos necessários para manter essas partes.  

Comecemos pelo mercado de trabalho: na Dinamarca, não apenas não existe salário mínimo imposto pelo governo, como também praticamente não há nenhuma indenização por demissão (nem por demissão sem justa causa).  O máximo que existe é uma indenização de seis meses de salário para quem trabalhou na mesma empresa por mais de 15 anos. 

Mais ainda: não há leis trabalhistas que restrinjam horas extras (empregado e patrão acordam voluntariamente as horas de trabalho), o que permite que as empresas dinamarqueses operem 24 horas por dia, 365 dias por ano.

E mais: o empresário não paga absolutamente nada em termos de previdência social do empregado.  Tudo fica por conta do próprio empregado (que paga 8%).  Eventuais negociações coletivas entre sindicatos e empresas não demoram menos do que 30 anos para a maioria dos assuntos relevantes (como estipular um salário-base para uma categoria ou as horas de trabalho semanais).  

Com efeito, 25% dos trabalhadores dinamarqueses não estão cobertos por nenhum acordo coletivo, sendo livres para negociar face a face com o empresário.

Em suma: a Dinamarca desfruta pleno emprego graças a um mercado de trabalho altamente liberalizado, em que os custos de contratar são baixos e os custos de demitir são quase nulos.  O mercado de trabalho dinamarquês é o quarto mais desregulamentado do mundo, perdendo apenas para EUA, Hong Kong, Cingapura e Brunei.

Com relação aos impostos, a Dinamarca se caracteriza por uma tremendamente agressiva tributação sobre o consumo.  Há apenas uma alíquota para o imposto sobre o consumo, o IVA (Imposto sobre Valor Agregado), e essa alíquota é de 25%.  O imposto sobre a eletricidade representa quase 60% do preço final do kWh (quase o triplo do da Espanha, por exemplo).  

E a lista de impostos especiais é interminável: sobre produtos petrolíferos, sobre o carvão, sobre o gás natural, sobre as emissões de CO2, sobre o dióxido de enxofre e sobre o dióxido de nitrogênio, sobre pratos e talheres de plástico, sobre pilhas e baterias, sobre a água, sobre o desperdício de água, sobre pneus, sobre bolsas de plástico, sobre automóveis, sobre o álcool, sobre o café, sobre o chá, sobre o sorvete, sobre o açúcar, sobre o tabaco, sobre os papeis de cigarro, sobre o jogo, sobre nozes e amêndoas, sobre seguros etc.

Esse modelo de tributação pesada sobre o consumo não é exatamente uma forma de “justiça social” para com os mais pobres.

Mas não pára por aí.  A tributação sobre a renda, por sua vez, também não é muito solidária para com os mais pobres.  Façamos uma comparação entre o Imposto de Renda de Pessoa Física da Dinamarca com o da Espanha: entre 3 mil e 19 mil euros, um dinamarquês paga 37,5% de IRPF, ao passo que um espanhol paga entre 19 e 24%.  Entre 19 mil e 23 mil euros, um dinamarquês paga 43,5% de IRPF, ao passo que um espanhol paga 30%.  E, a partir de 23 mil euros, um dinamarquês paga 59% de IRPF, ao passo que um espanhol paga 52%.

Ou seja, é justamente nas faixas de renda mais baixa que ocorrem as maiores discrepâncias na Dinamarca.

Por outro lado, no que tange ao Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, a Dinamarca apresenta um dos menores do mundo: a alíquota mais alta é de 23,5% (sendo que na Espanha é de 28%).  No entanto, há inúmeras deduções que os empresários podem legalmente fazer.  Quando se leva em conta essas deduções, a alíquota real cai para 7,5%, perante 20% na Espanha.  

No Brasil, com IRPJ de 15% mais sobretaxa de 10% sobre o lucro, mais CSLL, mais PIS, e mais COFINS, a alíquota total chega a 34%.

Para que uma economia que faz uso maciço de políticas assistencialistas continue crescendo, não apenas sua produtividade tem de ser muito alta, com também sua liberdade empreendedorial tem de ser a mais alta possível.  

E, segundo o site Doing Business, nas economias escandinavas, você demora no máximo 6 dias para abrir um negócio (contra mais de 130 no Brasil); as tarifas de importação estão na casa de 1,3%, na média (no Brasil chegam a 60% se a importação for via internet); a alíquota máxima do imposto de renda de pessoa jurídica é de 25%, mas há várias deduções legais que podem derrubar essa alíquota para 7,5% (34% no Brasil); o investimento estrangeiro é liberado (no Brasil, é cheio de restrições); os direitos de propriedade são absolutos (no Brasil, grupos terroristas invadem fazendas e a justiça os convida para negociar); e o mercado de trabalho é extremamente desregulamentado. Não apenas pode-se contratar sem burocracias, como também é possível demitir sem qualquer justificativa e sem qualquer custo. Não há uma CLT nos países nórdicos.

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